O CRIACIONISMO RELIGIOSO
Qualquer teoria que se proponha a dizer-nos como as coisas começaram, entra no campo da Cosmogonia[1]. O Criacionismo Religioso é percebido desde os primórdios da humanidade. Os povos da antiguidade buscaram respostas para afirmarem suas crenças em uma divindade que os trouxe à existência o universo, a terra, a natureza, podendo ser em muitos casos confundida com as propostas científicas. Conforme Adauto Lourenço (2007, p. xiv), define esse postulado: “É uma posição religiosa que aceita pela fé que certos escritos de determinadas religiões sobre a origem da vida e do universo são verdadeiros”.[2]
Não existe uma definição simples de religião que expresse todas as suas dimensões, mas a busca do homem por respostas sobre suas origens, junta-se ao seu ponto de vista religioso e isso é perceptível em todas as suas crenças e formas de compreender o divino. Nesse contexto, percebe-se que o criacionismo religioso tenta saciar essa necessidade buscando respostas para a seguinte pergunta: Quem é o criador ou divindade(s) responsável pela origem de tudo?
A religião tem sido uma das constantes preocupações da humanidade desde os seus primórdios. Em quase todas as culturas que hoje conhecemos, o fenômeno religioso está presente, em menor ou maior escala. (ROSA, 1992, p. 41). [3] Como na proposta do Criacionismo Científico, o postulado Religioso também não busca provar a existência de Deus, crendo na presença de uma divindade que controla os destinos dos homens e do universo.
Seria difícil, dizer qual a forma mais primitiva do fenômeno religioso. Segundo alguns autores, é possível traçar a origem da religião a começar do conceito de “mana”. Mana é uma palavra polinésia que significa uma força vaga, impessoal, mecânica, que controla os destinos do universo. Parece que todas as culturas de que temos conhecimento e em que há formas de comportamento religioso, a crença em um poder que controla os destinos do universo é básica e universal. (ROSA, 1992, p. 44).[4]
O homem em sua natureza necessita compreender as coisas que, em um primeiro momento, não entende, principalmente quando se trata do metafísico, do transcendente, daquilo que a ciência empírica muitas vezes não tem como justificar. Essa busca incontrolável do homem por entender as causas já era representada pela experiência dos primeiros pensadores, que buscavam compreender a causa primeira de tudo, aquilo que poderia justificar a criação e geração de todas as coisas. Desta forma, podemos observar como o homem necessita da compreensão e busca por respostas. (GOMES, 2014, p. 4).[5]
A existência do homem sempre o inquietou por buscas de respostas sobre o universo e sua origem (semen divinitatis).[6] O movimento dos astros, a evidência das estações, a multiplicação dos seres, a complexidade de toda essa realidade e a falta de compreensão daquilo que o cercava o têm levado a essa busca inquietante. Pode-se dizer também que a visão criacionista no contexto religioso é resultado da necessidade de tais respostas. Diante desse quadro, observamos que, mais importante do que o fato das nações ao redor de Israel terem seus próprios (talvez mais antigos) relatos da criação, era o uso pelo qual elas realizaram no antigo Oriente Próximo. Cosmogonias antigas não foram cuidadosamente registradas e preservadas por amor à história antiga; apenas eram a base da observância religiosa. No mundo antigo, suas divindades eram deuses da natureza, deuses do sol, deuses da lua, deuses da chuva e assim por diante. A fim de assegurar a continuidade das forças da natureza e garantir colheitas abundantes e rebanhos de gado em crescimento, os mitos da criação eram reencenados a cada ano.
A partir desse pano de fundo, podemos começar a perceber o papel vital desempenhado pela cosmogonia no antigo Oriente Próximo. A vida social e religiosa de Israel, como a de seus vizinhos, baseava-se em sua origem. O relato da criação de Gênesis estabeleceu as bases para o restante do Pentateuco. Sob esta luz, podemos ver o significado da disputa entre o Deus de Israel e os “deuses” do Egito. Faraó ousou perguntar a Moisés: “Quem é o Senhor que eu devo obedecer a Sua voz para deixar Israel ir?” (Êx 5.2). A resposta do Senhor foi uma série de dez pragas. Parece que cada praga era uma afronta direta a um dos muitos deuses do Egito e a mensagem dessas pragas era que o Deus de Israel é o criador do céu e da terra:
A visão por respostas é ampliada quando o prisma passa pelo pensamento filosófico. É preciso, porém, ir mais além do que a visão filosófica expõe, pois esse era exatamente o caso da visão da filosofia e dos filósofos que tinham o intuito de investigar este fato da religiosidade homem e da origem do mundo. Por todas essas razões, existe uma busca de construir um mundo com sentido transcendental, independentemente do sentido dado pela racionalidade das Sagradas Escrituras. É notório que isso só é possível dentro do contexto humano único, pois somente o ser humano demonstra comportamento religioso.
Para Alessandro Rocha (2010, p. 23), somente o homem e a mulher, dentre as várias formas de vida existentes, exibem comportamento religioso. Todas as culturas pesquisadas e registradas pelos antropólogos parecem demonstrar algum tipo de sentimento religioso, embora diferentes em sua expressão cultural da religião tradicional da cultura do Ocidente.[7]
Religião é a resposta dada às questões de caráter último do Homo religiosus: um importante aspecto, de caráter distintivo, do ser humano é que ele é um sujeito autoconsciente. Nunca o homem é simplesmente uma peça de seu ambiente, mas ele tem condições de destacar-se e até mesmo contraditar seu ambiente. A religião é para esse ser consciente a resposta dada às questões últimas, tais como: Qual o significado de minha existência? Oque fazer de minha vida? Por que estou aqui? Em suma, a religião oferece respostas às questões de origem e finalidade do ser humano e do meio em que ele vive. Nesse sentido, a religião pode ser descrita como o significado último da existência humana (ROCHA, 2010, p. 23).[8]
Conforme nos diz :
Sabemos sobre as religiões das primeiras sociedades pelas relíquias deixadas e pela história de civilizações recentes. Além disso, algumas tribos isoladas em lugares remotos, como a floresta amazônica na América do Sul, as ilhas indonésias e parte da África, ainda praticam religiões aparentemente inalteradas há milênios. Os praticantes dessas religiões ancestrais, de um modo geral, creem na união entre a natureza e o espírito, vinculando inextricavelmente o indivíduo a seu meio. Com a evolução das primeiras religiões, suas cerimônias e sua cosmogonia se tornaram cada vez mais sofisticadas (CAMILA, 2016, p. 12).[9]
Onde estavas tu quando eu criei a Terra? Diz-me, se tens entendimento! Jó 38.4
[1] Cosmogonia – Essa palavra vem dos termos gregos “kosmos”, mundo, e “gignesthai”, nascer. Isso posto, o termo é usado para indicar as origens do mundo ou do universo. Qualquer teoria que se proponha a dizer-nos como as coisas começaram, entra no campo da cosmogonia. CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. 13. ed. São Paulo: Hagnos, v. 1, 2001, p. 938-939.
[2] LOURENÇO, A. Como tudo começou: Uma introdução ao Criacionismo. 1ª. ed. São José dos Campos: Editora Fiel, 2007.
[3] Professor de Psicologia da Religião no Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil.
[4] ROSA, M. Psicologia da Religião. 3ª. ed. Rio de Janeiro: JUERPE, 1992.
[5] GOMES, R. R. F. Introdução à filosofia da religião: elementos básicos para a compreensão da religião. Seminário Arquidiocesano São José. Rio de Janeiro, 2014.
[6] Calvino chamou isso de semen ou sensus divinitatis, ou seja, o próprio Deus fez o homem um ser religioso. É o senso divino que faz tocar as cordas da harpa de sua alma. Em sua forma original a religião é exclusivamente um sentimento de admiração e adoração que eleva e une. Uma das questões importantes na história da teologia reformada, e que continua a ser discutido sobre o Calvinismo contemporâneo e filosofia da religião, envolve a questão da discussão do conhecimento natural de Deus nos capítulos de abertura das Institutas da religião cristã; isso pode ser tomado como uma apresentação de argumentos para a existência de Deus (CALVINO, 2006, p. 68 apud BOTELHO, 2012, p. 5). BOTELHO, Marcos Campos. Processos históricos da relação entre ciência e religião. 1912. 11 p. Artigo (Revista de Teologia da Faculdade FAIFA), Universidade Federal de Goiás, Goiana, 2012. Vol. 4 N° 1.
[7] ROCHA, A. Uma introdução à filosofia da religião: um olhar da fé cristã sobre a relação entre a filosofia e a religião na história do pensamento ocidental. 1ª. ed. São Paulo: Editora Vida, 2010, p. 23.
[8] Ibid.
[9] WERNER, C. O livro das religiões. Tradução de Bruno Alexandre. 2ª. ed. São Paulo: Globo Livros, 2016.
*Conforme Lei de Direitos Autorais – Lei 9610/98, está proibida a reprodução total ou parcial desse artigo, sem a autorização expressa do autor. A violação está sujeita às sanções da lei citada.
1 Comentário